Empresa de fachada, distribuidora de cimento, alcunha falsa em planilha, notas fiscais frias, uso de advogados e indícios de pagamento de R$ 11 milhões. Essas são as informações que constam na delação premiada de sócios e executivos da Galvão Engenharia, empresa que venceu a licitação para a reforma da Arena Castelão, em Fortaleza, que serviu como base para a PF (Polícia Federal) deflagrar, na última quarta-feira (15), operação contra o presidenciável Ciro Gomes, o senador Cid Gomes (PDT/CE) e o secretário de Infraestrutura da capital cearense, Lucio Gomes.
As delações foram feitas à PF pelos empresários Mário de Queiroz Galvão, Dario de Queiroz Galvão, Jorge Henrique Marques Valença e Ubiratan Ferreira de Queiroz. Os depoimentos foram colhidos em agosto deste ano e mostram como ocorreram os supostos pagamentos de propina à família Gomes em troca de favorecimento pela reforma, ampliação, adequação, operação e manutenção do estádio, que foi uma das 12 sedes da Copa do Mundo de 2014, realizada no Brasil.
Embora a operação tenha ocorrido agora, de acordo com as investigações, as irregularidades teriam acontecido entre 2010 e 2013. A quebra do sigilo telefônico, autorizada pela Justiça, pode, no entanto, não obter resultados, tendo em vista que as operadoras não são obrigadas a armazenar os arquivos por tanto tempo, como destaca a própria decisão do juiz. O Ministério Público Federal do Ceará se manifestou contrário às buscas, justamente por causa do tempo decorrido entre os fatos e as diligências.
De acordo com a PF, há indício de pagamento indevido de R$ 11 milhões para favorecer a Galvão Engenharia. Os agentes cumpriram 14 mandados de busca e apreensão em endereços de Fortaleza, Meruoca e Juazeiro do Norte, além de São Paulo, Belo Horizonte e São Luís. A determinação para que os policiais buscassem mídias digitais, celulares e documentos foi da 32ª Vara da Justiça Federal.
Em seu depoimento, Mário Galvão contou que o levantamento de dinheiro em espécie era feito com a utilização de notas fiscais frias fornecidas pela empresa Distribuidora Noronha, sediada em Fortaleza, que atuava na distribuição de cimento e aço no varejo. O dinheiro, delatou o empresário, era recebido por ele próprio, uma vez que se tratava de “dinheiro pequeno”.
No entanto, a Galvão Engenharia não comprava cimento da Distribuidora Noronha, segundo depôs Ubiratan Queiroz. “Ou seja, todas as transações registradas com essa empresa referem-se ao esquema de levantamento de dinheiro em espécie para pagamento de propina”, diz o relato contido no documento, acrescentando que as quantias estão em posse do financeiro da empresa, que já foi alvo da operação Lava Jato.
O empresário conta que a comissão para a empresa de cimento era de cerca de 7%, “ou seja, ele devolvia 93% do valor constante da nota em espécie para a Galvão Engenharia”. Segundo Ubiratan, o esquema contou também com uma empresa de fachada nesse caso, a quantia destinada era mais alta, variando de 12% a 14%.
Jorge Valença informou, inicialmente, que os pagamentos ocorreram no período de dezembro de 2010 até novembro de 2011. “A planilha fornecida como anexo de colaboração premiada aponta a realização de 12 pagamentos aos advogados”, diz trecho. Em outro depoimento, porém, fala que os valores das propinas foram pagos durante toda a execução da obra do Castelão, por cerca de dois anos.
O empresário disse que pode ter havido pagamento de valor não registrado na planilha. De acordo com ele, Lúcio Gomes recebeu a alcunha de LGTTELA PLANA no esquema. Os valores da propina, informa o documento, foram entregues apenas a uma pessoa, Hélio Parente.
Dario Galvão, por sua vez, afirmou que os supostos pagamentos de propinas eram “determinantes” para que o grupo pudesse viabilizar novas contratações com o Governo do Ceará. O trecho do documento relata que o empresário “teve participação direta nos recebimentos de valores importantes do Castelão”.
Em relatório, a PF descreveu a seguinte metodologia utilizada para corroboração das alegações dos empresários da Galvão Engenharia: comparação dos fluxos dos supostos pagamentos de propina com as datas dos desembolsos efetuados pelo estado do Ceará, exame do teor dos e-mails apresentados pelos executivos no contexto das negociações, análise dos atos que compuseram o procedimento licitatório que envolveram a Arena Castelão e análise das vinculações existentes entre os agentes públicos com os irmãos Gomes.
Wesley Batista
Em sua decisão, o juiz federal substituto Danilo Dias Vasconcelos de Almeida cita comparação feita pelos agentes com o caso de corrupção integrado por Wesley Batista, que também realizou acordo de delação premiada este, por sua vez, com exceções, com imunidade penal e autorização para viver fora do país.
“Consignou a autoridade policial que esse modus operandi descrito no presente caso se assemelha ao noticiado por Wesley Batista sobre Cid Gomes, no sentido de que a liberação de recursos do Estado só era possível após o pagamento de propinas disfarçadas de doações a candidatos e partidos”, conta.
Fonte: Todo Poder Emana do Povo