Presidente brinca com repórter: ‘Se eu chamar você de fofucha, pronto, vai ser o fim do mundo’
Ao final do primeiro ano de mandato, em uma mesa à beira da piscina no Palácio da Alvorada, o presidente Jair Bolsonaro indicou que nada vai mudar em sua atuação pública daqui para a frente, mesmo depois das críticas. Disse que é “tosco” mesmo no trato com outros líderes internacionais, mas que isso funciona, afirmou que não vê seu linguajar como “ofensivo” e brincou sobre ter dito que a única filha mulher foi uma “fraquejada”: “me dei mal”.
Vestido com a camisa do Flamengo (que seria derrotado horas depois na final do Mundial), tênis e calça jeans, Bolsonaro recebeu, na manhã de sábado, no Palácio do Alvorada um grupo de jornalistas que acompanham o dia-a-dia do governo. Rodeado de repórteres, admitiu que exagerou e disse que, diante da repercussão negativa de suas declarações, há espaço para arrependimento. “Sim, eu erro. (ocorre de refletir que) Não devia ter falado”, respondeu, um dia depois de dizer que um repórter tinha “uma cara de homossexual terrível”. “Eu me controlo quando passo para conversar com vocês. Sei que vocês provocam para ter manchete, a gente sabe disso aí”, completou.
Apesar das “pancadas”, como define as críticas que recebe, Bolsonaro diz não que vê como ofensivas suas declarações. “É minha maneira de ser. Não dá para mudar isso daí. Pau que nasce torto. É o linguajar que eu tenho, eu não vejo como ofensivo. O politicamente correto nos leva para um lado que a gente tem que raciocinar o que eu falar para você. Se eu chamar você de fofucha, pronto, vai ser o fim do mundo”, respondeu à repórter da ÉPOCA.
Bolsonaro reconhece que seu estilo é diferente de seus antecessores no Palácio no Planalto, mas afirma que, apesar disso, conseguiu manter bons relacionamentos com líderes mundiais. Em seu primeiro ano de mandato, o presidente se reuniu com chefes de Estado com Estados Unidos, China, Índia, Japão, Arábia Saudita, Emirados Árabes, entre outros.
“A maneira como me tratam, apesar de ser uma pessoa tosca na política ainda. Eu reconheço isso, não tem problema não. Sempre fui do baixo clero, a maneira como me tratam é excepcional porque o Brasil tem atrativos”, disse.
O presidente celebrou a relação com o presidente americano Donald Trump, de quem nunca escondeu a admiração, e o fato de ter conversado por 15 minutos com o americano e obtido o compromisso que os Estados Unidos não vão sobretaxar o aço e o alumínio brasileiros. Bolsonaro contou que a conversa foi acompanhada por quatro integrantes do Itamaraty, que tinham a determinação de interrompê-lo caso cometesse algum deslize.
“Tinha quatro pessoas do Itamaraty ali. O meu linguajar é diferente de outros presidentes. O que você tira no final? Você cumpriu a missão, eu cumpri a missão no meu linguajar. Eu dou ordem que se estiver algo errado, escrever aqui. Estou conversando com o homem mais poderoso do mundo, belicamente, econmicamente. Não é uma conversa do mesmo nível nosso ou próximo. Há uma diferença”, observou.
Em princípio, a conversa com os jornalistas, que começou às 9h, duraria apenas uma hora. Quando se aproximou do horário previsto para o fim, Bolsonaro sinalizou aos seus auxilares pessoais que gostaria de continuar falando com a imprensa. “A vida é sacrificante. Geralmente, é uma monotonia. Estou até feliz de estar com vocês aqui”, disse.
Caso não tivesse recebido jornalistas neste sábado, Bolsonaro disse que teria nadado 200 ou 300 metros na piscina 50×18 metros no jardim interno do Alvorada. Em seguida, teria se fechado em seu escritório para “bolar coisas para as mídias sociais, para divulgar, o que fazer, mandar zap para ministro”.
Em seu dia-a-dia, Bolsonaro diz não ter tempo para ler livro nem assistir a filmes e séries. Nada apenas duas vezes por semana. “Não dá mais. A gente fica atrás de informação”, diz Bolsonaro, que jura checar a procedência das notícias para saber se não está diante de uma fake news.
O único passatempo, segundo ele, é jogar cartas com a caçula, Laura de 9 anos. “A Laura. A da fraquejada, lembra? Fui fazer uma brincadeira e me dei mal. A Laura joga aquele joguinho, Uno”. Aos repórteres, Bolsonaro confessou que se surpreendeu quando ao conversar sobre um hipotético irmãozinho, a garota rejeitou a história da cegonha. “Jamais esperava ouvir isso dela.”
Além da monotonia, outra reclamação de Bolsonaro é o excesso de protocolos de segurança. Segundo ele, muitas de suas escapadas ocorrem quando encontra uma brecha na agenda. Em cima da hora avisa à segurança institucional que vai sair em 15 minutos, mas não costuma nem dizer o local. Acredita que o fator surpresa é melhor.
“É chato (excesso de segurança), mas eu sei que abuso. O pessoal tem preocupação. Eu boto colete, muitas vezes, o que que é natural, mas ali um aço na cara, um furada no pescoço, eu sei que pode existir, mas tem que correr esse risco”, diz Bolsonaro, que afirma ter aprendido a lidar com o risco de morte.
Neste ano, Bolsonaro já parou na Praça dos Três Poderes para tomar um picolé, foi à uma feira popular de importados comer pastel, pilotou moto e jet ski, parou em uma estrada para almoçar com caminhoneiros, foi a pé ao Congresso e fez visitas surpresas aos ministérios. Além disso, todos os dias para para falar com apoiadores na porta do Alvorada. Ele nega que essas suas ações sejam populistas. “Todos os dias vão me acusar de alguma coisa. Eu não faço isso por populismo. Eu sei como as pessoas se sentem ao cumprimentar uma autoridade, imagina um presidente.”
A praxe é que encontros como o deste sábado sejam organizados pela Secretaria de Comunicação com dias de antecedência. No caso do atual chefe do Executivo, a entrevista fora acertada, no noite anterior, diretamente entre ele e repórteres, que solicitaram ao presidente para serem recebidos para um café na residência oficial para que ele fizesse um balanço de 2019. O presidente, aos risos, disse que não teria café, mas os receberia para “chupar uma manga” e dar uma volta de duas horas no Alvorada.
A conversa se encerrou próximo de 11h30. Foram servidos água e café. Quando os repórteres se preparavam para entrar no Palácio da Alvorada, um apoiador exaltado se dirigiu aos jornalistas. “Espero que vocês parem de fazer um jornalismo canalha. Espero que tenha manga com veneno para vocês”, disse.
Fonte: ÉPOCA